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quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Rua Cordura

Quem conhece o município de Mesquita, Baixada Fluminense, deve saber da existência duma rua chamada Cordura. Acho cordura uma palavra bonita, sonorosa. Seus significados básicos de prudência, disposição amistosa e cordialidade embelezam-na mais ainda. Tipo de palavra que em tudo e por tudo se qualificaria para entrar numa lista lexicoterápica.

Mas a gente de lá realmente não é muito de consultar dicionários. Aparentemente, desconhecem a palavra. Fazem então o que costumam fazer com palavras estranhas, insólitas ou 'difíceis', ainda que muito bonitas. Desconsiderando a inequívoca inicial C nas (poucas) placas [e onde mais o nome apareça "oficialmente" ortografado], como se se tratasse de algum erro, substituem-na automaticamente por um G, e com isso a transformam na palavra usual mais próxima. Não só dizem como também escrevem Gordura, oficiosamente. Li num ônibus: "Passa na Rua Gordura". Com G, mesmo. Rebatizaram a tal rua, na prática.

O fenômeno nada tem de raro nem local. Ao contrário, ocorre no mundo inteiro. Só para dar um exemplo em inglês, "asparagus" (aspargo, pra nós) acabou sendo também conhecido informalmente como "sparrow grass", numa óbvia facilitação a um só tempo prosódica e etimológica. É a chamada etimologia popular, criativa e criadora de um sem número de expressões como "cuspido e escarrado" (de 'esculpido em Carrara'), "mal e porcamente" (de 'mal e parcamente'), e tome de etc.

De início, considera-se qualquer forma assim transformada como incorreta, um desvio da norma, uma corruptela, algo a se evitar. Só que muita vez a nova forma se consagra, ao ponto de ganhar abonação em dicionários. Foi aliás desse jeito que se formaram, a longo prazo, todas as línguas descententes em linha direta do velho e defunto latim, como o francês, o espanhol, o italiano, nosso vernáculo etc.

Quando criança, ouvi muito a forma "bêbado" ser corrigida. O certo à época era "bêbedo". Só que neste caso a forma "correta" com o tempo foi perdendo força e a "errada" se impôs, pelo uso. Caso pra lá de corriqueiro.

Manuel Bandeira comenta o nome do rio Capibaribe. Lembra ele que um velho professor seu fazia uma questão danada da forma correta, Capiberibe, embora o povo por qualquer razão já privilegiasse disparado a outra, com a. Trata-se da mesmíssima oposição bêbado x bêbedo, com o mesmo resultado final, inclusive.

Existem leis fonéticas, muitas delas, por trás dessas transformações por que formas léxicas normalmente passam na evolução histórica de qualquer língua.

Palavras como aipim, engajar, mortadela, mendigo, e muitas outras sofrem nasalização, uma transformação de frequência bem alta (virando, no caso, aimpim, enganjar, mortandela, mendingo, etc.).

Igualmente comum é a transposição de certos encontros consonantais como os de pedra, estupro, vidro, etc. (dando preda, estrupo, vrido, etc.).

É nessa base também que, por exemplo, aviso ‘prévio’ vira aviso ‘breve’ e o ralo ‘sifonado’ vira ralo ‘sanfonado’ juntamente com grande número de casos análogos.

A formação de alguns compostos populares é muito expressiva, geralmente também humorística, como em analfaburro, apertamento, batatalhau, contrachoque, crionças, irmãe, mergulho (não parece um composto, mas o segundo componente é “bagulho”), namorido, paitrocínio, robauto, televizinho(forma dicionarizada), trêbado, tricha, urubusservar e por aí vai.

Há subversões intencionais de expressões com idêntico efeito, como em ‘um abraço e um queijo’, ‘meus parachoques pra você’, ‘suáveis prestações’, etc., etc.

Nada a lamentar, se mencionada rua ficou condenada a uma indesejável obesidade sem causa, só por conta e ao gosto do povo do lugar. Para mim, pena é que, por lá, cordura não tenha “colado”.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Um Léxico Pacificador: Boa Ideia!

Tenho uma amiga virtual mais ou menos recente que compartilhou em seu blog uma experiência pedagógica.

Chamou-me a atenção o tremendo interesse lexicográfico ali implícito. A ideia, de nobre propósito, é facilmente aplicável e tem ótimos resultados a médio e longo prazo. Entendi que o custo seja bem pequenininho, ainda mais em vista de relevantes resultados no combate à violência.

A arma? Palavras. Fiquei imaginando uma profusão de dicionários especiais cujos lemários seriam criados para produzir no utente reações não violentas.

Na década de 80, tive a oportunidade de traduzir do italiano as atas do oitavo congresso mundial de musicoterapia, que acabara então de realizar-se na Itália, por solicitação de uma editora. Acabei nem sabendo se esta tradução foi ou não publicada.

Então, a música tem suas propriedades curativas reconhecidas pela medicina, que inclusive a vem prescrevendo não é de hoje como remédio, um remédio como qualquer outro, como qualquer fármaco à disposição de quem sofre seja lá do que for.

O que é que está faltando então para que pessoas devidamente qualificadas e investidas de autoridade encarem com igual seriedade esse tremendo potencial que há nas palavras e está praticamente inaproveitado como recurso no desesperadamente necessário combate a todas as formas e manifestações da violência? Ou para que a própria experiência da Graça se multiplique por quantos dela tiverem conhecimento e a desejem reproduzir no âmbito educativo bem como em vários outros?

Quantos maridos ainda não descobriram quanta coisa pra lá de óbvia dá pra fazer com suas respectivas mulheres e que é incomparavelmente melhor em qualquer sentido inclusive pra eles mesmos do que bater nelas? Quantos filhos inclusive pequenos estão agora vivendo sob um clima de terror justamente em casa, onde se espera eles tenham amor, carinho, e proteção? E não é só a violência doméstica. Tem a urbana, que vem escalando a níveis dificilmente suportáveis para os cidadãos de boa paz. Em resumo, há violência demais por aí, sim. Todos nós sabemos muito bem disso e muitos de nós realmente queremos que assim não seja. Estamos dispostos a fazer o que for possível? A partir do momento que todos responderem sinceramente sim, isto quererá dizer em termos práticos que foi a violência que perdeu. Boa música, boa conduta, uma boa disposição, boas palavras, vale qualquer coisa desde que funcione, certo?

Se a divulgação da experiência singela e bem sucedida da minha amiga Graça puder servir de referência e inspiração para muitas mais outras iniciativas neste sentido, é de se acreditar que ainda chegaremos a resultados realmente satisfatórios em ponto graudo, algum dia. Faço então a minha parte redirecionando meus leitores ao blog Os Botões de Madrepérola. Nada custa visitar o referido blog e ler o post de que falo em

http://botoesmadreperola.blogspot.com/2009/10/nao-violencia-meu-recado-possui-um-teor.html

Quero ver as palavras cumprirem mais este destino, para o bem das gerações que nos sucederão.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Le Littré, uma Obra de Mestre

Um endereço que quem lida de alguma forma com o idioma francês não deve desconhecer é

http://francois.gannaz.free.fr/Littre/accueil

Nada menos que Le Littré. Que dicionário grandioso!

Esta antiga maravilha lexicográfica já prestou muitos e relevantes serviços a diversas gerações de utentes, mas nem todo esse tempo transcorrido desde sua confecção transformou-a em mera curiosidade histórica sem qualquer outra serventia. Ele ainda hoje serve (e como!) para nele aprendermos coisas perfeitamente válidas sobre o bom uso de palavras e fraseologia em idioma francês. Ainda podemos nos fiar no que diz para definir palavras, principalmente as mais importantes.

A obra original aqui apresentada já se acha há bom tempo em domínio público, portanto não está atualizada. Mas vale a pena realmente conhecer e servir-se dela, ainda. Inclusive como modelo ou exemplo. Esta versão ressente-se naturalmente, como aliás a quase totalidade do que se acha disponível em versão virtual, da indesejável presença de erros de digitação, em quantidade bem maior que na obra impressa. Consta inclusive uma advertência neste sentido na apresentação da versão virtual. Mas nada enfim que chegue a comprometer seriamente seu incrivelmente rico conteúdo.

Para dar só um exemplo, logo no início do verbete exocet, podemos ler o seguinte, sic:

"Genre de poissons malacoptérygiens abdominaux, pourvus. de grandes nageoires pectorales qui leur permettent de ... "

O ponto depois de ‘pourvus’ é evidentemente intruso, mas pelo menos a palavra seguinte tem inicial minúscula, como se o tal ponto não estivesse nem ali. O diabo é que está, merde!

Pressa na digitação e cochilo na revisão, claro, mas pelo menos neste caso sem qualquer prejuízo ao consulente fora, convenhamos, um pouco de afeiamento. Logo numa obra de tantos méritos! Fazer o quê?

Pelo rigor na seleção das palavras e dos exemplos, pela clareza, concisão e objetividade nas definições, pelos critérios rigorosos na apresentação, enfim praticamente em tudo e por tudo, o Littré ainda supera muitos dos dicionários atuais.

Após o título a cada entrada, vem sempre a classificação gramatical da palavra acompanhada quase invariavelmente de alguma informação sucinta porém relevante sobre seu uso como tal, que pode ser algum detalhe sobre a pronúncia (à época do autor, o alfabeto da Associação Fonética Internacional ainda nem sonhava de ser inventado, mas a figuração de pronúncia que ele utiliza é muito boa, e realmente orienta o consulente onde cabe fazê-lo), ou então sobre a da flexão da palavra, ou ainda qualquer outra informação congênere que o termo francês peça. Podemos com segurança atribuir à regra mais geral todo e qualquer caso onde nenhuma destas informações estiverem presentes. Requinte como este só mesmo um dicionário excelente pode oferecer.

As definições são de regra bastante precisas. Aplicada a tal regrinha da substituição, veremos que sempre funciona, uma beleza. A cada acepção registrada, farta exemplificação de bom emprego da mesma, extraída em geral da obra de autores pra lá de consagrados.

No final, uma seção etimológica. Não custa termos boa vontade aí, já que com o que se sabia neste campo nos tempos de Littré, ele realmente fez o que dava e com indiscutível competência, seriedade, responsabilidade. Até onde não acertava em cheio logo de saída, ele levantava muito bem fundadas hipóteses com base naquilo de que dispunha. Quanto a etimologias, portanto, fora a ressalva de que sempre convém averiguar o que consta nas melhores fontes atuais, a obra ainda presta serviços, já que muito do que registra ainda não foi contestado.

O Littré não é, claro, uma obra definitiva para etimologias. Já mereceu innclusive diversas revisões à luz de novos estudos, o que aliás também vale para todos os dicionários posteriores, no que consignam.

Obsolescer como obra de consulta é só uma questão de tempo para qualquer dicionário, só que quando isto fatalmente acontecer aos melhores dicionários atuais, o Littré ainda existirá pelo menos na condição de uma respeitável referência.

Somente à guisa de comparação, hoje em dia ainda existe quem execute, quem ouça a obra de compositores como Bach, Beethoven, Mozart e alguns outros, bem como quem para estudá-las sobre elas se debruce por anos, décadas não existe? E pelo que estas obras são, só se pode esperar que seus apreciadores continuem sempre existindo.

Justamente como estas obras estão para a música, está o Littré para a lexicografia, sem qualquer hipérbole.

domingo, 21 de junho de 2009

Avalie Seus Dicionários

Claro que no post de hoje não vou apresentar todos os critérios de que um avaliador de dicionários precisa. Entraríamos fatalmente (este é o termo) num cipoal de minudências de pouco interesse para quem só vai, por exemplo, comprar ou usar determinado produto e deseja escolher um que lhe sirva satisfatoriamente. Não obstante, umas poucas considerações talvez lhe sejam de serventia numa hora destas.
Nessa crença, então, vamos lá.

A quantidade de dicionários (físicos, eletrônicos ou virtuais) existentes hoje em dia no mercado é assombrosa. Não admira que em meio a tal abundância de opções facilmente encontremos produtos que com o uso intensivo se revelem francamente insatisfatórios. Só para ilustrar, a ATA (American Translators Association) realizou há tempo uma pesquisa exaustiva, onde ouviu tradutores de costa a costa no país, e em resumo chegou-se à conclusão de que estes profissionais que utilizam dicionários técnicos exaustivamente tinham principalmente as seguintes queixas: a) inexatidão (inaccuracy), b) lastro (ballast) e c) omissão (omission).

A primeira queixa, inexatidão, diz respeito ao fato de o consulente ser mal orientado em dicionários por registros imprecisos que frequentemente o levam a cometer erros pelo menos lamentáveis, quando não de consequências desastrosas. Fiando-se no que encontra num dicionário técnico, ele traduz de conforme com o que consultou e ... erra. Isto infelizmente é muito mais corriqueiro do que se imagina, e no fim das contas vem em prejuízo da qualidade das traduções. Seria altamente desejável que os dicionários, principalmente os especializados, fossem muito mais precisos em suas definições e nas correspondências terminológicas entre idiomas.

A queixa do lastro refere-se à irritante presença de verbetes desnecessários que dão volume, sim, mas não peso à obra referencial. É o que aqui apelidamos de "encher linguiça". São muitos os lexicógrafos adotam indiscriminadamente esta prática abominável.

Omissão é a terceira frustração mais comum do consulente, que depois de encontrar definições imprecisas que induzem a erros e vários verbetes praticamente inúteis, descobre espumando de raiva que justamente aquele termo que com razoáveis motivos esperava encontrar naquele dicionário ... simplesmente não consta.

Então, as queixas mais frequentes de todo um conjunto de consulentes muito intensivos de dicionários nos ensina algo a buscar num bom dicionário. Um dicionário ideal seria preciso e claro em todas as suas definições, omitiria todas os dados irrelevantes ou não pertinentes e traria mesmo todos os termos que provavelmente levassem um consulente a abri-lo.

Não é difícil colocar estas características à prova no(s) dicionário(s) de que você costumeiramente se serve.

O melhor teste prático para você formar rapidamente alguma ideia sobre a qualidade das definições do seu dicionário é bem simples. Consiste em apenas substituir o termo definido em seu contexto pela própria definição que o dicionário apresenta. Se a definição "não encaixar" no lugar do termo a que se refere, já se tem claro indício de má definição. A boa definição, e só a boa, sempre equivale perfeitamente ao próprio termo definido. Não há que errar. Fácil, não?

Ah, e não só as definições em qualquer dicionário devem passar no teste da substituição. As equivalências também. Um termo apresentado em dicionário como sinônimo de outro tem o dever de poder substitui-lo no contexto pertinente. Mas haveria tantas ressalvas e considerações a fazer aqui, que neste caso direi somente que o teste da substituição simples não funcionará sempre, como deve no das definições.

"Forte", por exemplo, é um adjetivo que quando aplicado a café naturalmente não aceitará os sinônimos dicionarizados. "Mole" é antônimo de "duro", mas a expressão "dar mole" não é antônima de "dar duro", ou "estar duro" (sem dinehiro) não é o antônimo de "estar mole". Cuidado, então.

domingo, 31 de maio de 2009

Então, aos dicionários!

O primeiro dicionário que comentaremos aqui é o Aulete em sua versão eletrônica.

Minha parceira e colaboradora do "En Français Aussi" tem em seu computador (de onde agora improviso este post) uma versão baixada. Examinamo-la rapidamente.

Secar Já encontramo-lo ao abrir o dicionário, e sua leitura nos proporcionou a agradável sensação de contarmos com um produto lexicográfico de confiança, reputado e todos os etcéteras que cabem para um dicionário pra lá de consagrado: um Aulete.

Para simples contraste, fomos logo ao verbete dar, que no Aurélio (de papel) tem pra mais de cem acepções. Ali, encontramos só 34, além de um punhadinho de expressões contendo o verbo dar (acompanhado de qualquer coisa), em separado. É pouco, claro, mas o verbete é bom, no pouco que traz. Salvo certos descuidos de digitação (que não deveriam ser tolerados numa obra de referência que se preze), como em:
dar...
" 29 Exalar (cheiro bom ou mão) [td.: Essa trepadeira dá um cheiro maravilhoso.]" (negrito nosso).
Evidentemente, a palavra "mão" neste verbete é intrusa e só pode ter-se formado de um erro de digitação, explicável pela proximidade das teclas 'm' e 'n' em teclados comuns, mas aqui inadmissível. São erros gritantes (embora nem sempre tão óbvios), que se vierem em profusão podem conspurcar a reputação até mesmo de um Caldas Aulete.

Fomos ainda a outro, sugerido por minha companheira desta viagem lexicográfica. Aí, a primeira grande surpresa. O verbete "saber".
Sua apresentação parece descredenciar totalmente nossa versão digital do Aulete. Apresenta inicialmente quatro acepções para o substantivo masculino (uma das quais eu não sabia, trata-se de regionalismo do Rio de Janeiro, talvez de limitada circulação ou em desuso).
Depois, uma sequência de expressões contendo a palavra "saber". Logo na terceira, a chocante " Não sabera quantas anda ". (negrito nosso) Falta um espaço, num erro óbvio da digitação, culminado numa óbvia negligência da revisão, que nos legou esta forma que - convenhamos - não pode depor favoravelmente ao produto, afinal de contas um Aulete, né?

Para encerrar, no verbete conforme apresentado não aparece nenhuma das tantas acepções do verbo saber. Um verbete estropiado em cujo canto superior direito se lê "verb. atualizado". Quase saio dele totalmente decepcionado com o Aulete eletrônico, mas ainda ocorre-me clicar sobre estes suspeitos dizeres. Faço-o e, felizmente, a área é sensível. O clique me conduz ao verbete original. Meno male, depois desse indigesto porre de erros e desse susto com a integridade da meritória obra referencial.

E lá está todo o verbete "saber". Muito bom, inclusive. Agora, é uma versão em que o Aulete se reconhece. Só me ressinto de o plano gráfico acompanhar o das edições em papel. Aqui, não haveria qualquer necessidade de economizar tanto o espaço físico. As diferençadas consignações mereceriam mais cortesia(*) espacial para facilitar a leitura. E chega de me queixar de coisa boa. É o Aulete, sim, com as devidas ressalvas.

O dicionário Aulete digital está no URL http://www.auletedigital.com.br/download.html
Para quem faz questão de um bom produto lexicográfico, e ainda por cima baixável gratuitamente, ei-lo. Boas consultas.

Uma palavrinha final. Este post dá início a uma série em que tratarei de assuntos mais diretamente lexicográficos. Comentaremos, por exemplo, diversos dicionários e demais obras de referência físicas ou em versão eletrônica.

Este post, quando ainda era apenas um rascunho eletrônico, passou pelo crivo da leitura atenta de minha mencionada parceira, sem o que correria o risco de ser publicado mesmo eivado de erros de digitação meus, contra os quais me insurjo quando encontro em obras de referência.

(*) Cortesia é um termo especializado da lexicografia prática. Significa o espaço deixado em branco no início e no final de uma seção de obra (dicionário, enciclopédia e quejandos). Consulte José Sosa, Lexicografía Práctica, Gredos (se não me engano). Espanha. Não lembro ano nem mais nada.

domingo, 17 de maio de 2009

Prolepses no Lexicografia

Pretendo dar início a uma série de artiguinhos onde procurarei argumentar sobre a utilidade de se adquirir um bom vocabulário antes de sugerir técnicas e estratégias para atingir tal objetivo, quem sabe até algum workshop.

Para quem já tem um vocabulário vasto haurido, por exemplo, em dezenas de milhares de horas de leitura, ou para quem já está se mobilizando de alguma forma no sentido de enriquecer o seu, pode muito bem ser que tudo soe desnecessário, como um chover no molhado.

Já para quem predescarta a possibilidade de incluir leitura intensiva em sua vida e/ou não compreende para que diabos serve ter um vocabulário rico ou mais rico, o provável é que tudo o que eu venha a dizer neste sentido resulte inútil, como murro em ponta de faca.

Vou esforçar-me então para nem chover no molhado nem esmurrar pontas de faca, presumindo que ainda haverá leitores para quem digo algo que mereça ouvidos e quiçá providências.

Num blog concebido para dialogarmos sobre palavras permito-me um pouco o uso de palavras "difíceis". Acho bem mais acertado interpretá-las como um incentivo prático, objetivo e oportuno a que os leitores consultem seus próprios dicionários do que presumir por exemplo que eu esteja me mostrando deliberadamente pedante, falando empolado, ou sendo gratuitamente incompreensível. Eis minha primeira prolepse.

Argumentarei ainda (aqui como alhures) pela leitura de dicionários, que sempre recomendarei. Só pessoas de muito alto nível intelectual sabem o que é um dicionário? Só pessoas de muito alto nível intelectual entendem que dicionário é livro? Só pessoas de muito alto nível intelectual concluem que qualquer livro se lê? Só pessoas de muito alto nível intelectual alcançam o conceito de que livro também é coisa que se escreve? Estou definitivamente convencido de que não, apesar de sabe Deus quantos poréns.

Então voltarei sempre à vaca fria: passei a vida inteira fazendo isso (de ler dicionários) e não me arrependo mesmo. Posso (e quero) testemunhar aqui de todos os benefícios - ainda que intangíveis - que certos bons hábitos garantidamente trazem, principalmente a médio e longo prazo. Antes que a vaca enlouqueça e vá pro brejo.

sábado, 18 de abril de 2009

Coprologia à Parte

[Segue extrato do que escrevi alhures após me censurarem a palavra merda]

Para os que porventura não saibam e nem sequer desconfiem, mas queiram saber e não tenham tanta raiva (ai de mim, erudito de merda!) de quem sabe, minha impublicável palavra procede do latim. Procedência suficientemente atestada em fontes bastante seguras e confiáveis. Era originalmente “merda, merdae”, um bom substantivo feminino de primeira declinação, na língua dos romanos da antiguidade clássica. Chegou-nos pelo acusativo singular “merdam”, o que também aconteceu com a esmagadora maioria dos nossos substantivos provindos do latim. (1)


Natural que “merda, merdae” não fosse, nem sequer no latim vulgar, que dirá no latim clássico, um termo dos mais prestigiosos. Nunca o encontrei nos modelares Cícero ou Virgílio (cujas respectivas "obras", também, não cheguei a ler integralmente, muito menos atrás de “merda, merdae” logo ali, só pra poder agora, a essa altura do campeonato, oferecer-lhes qualquer garantia que seja a esse respeito), mas posso dar-lhes certeza de já ter visto “merda, merdae” em autores de grande credibilidade. Só que isso foi lá naqueles bons(?) tempos de faculdade, tempos em que eu lia latim vorazmente, a ponto de saber conjugar e declinar tudo bem direitinho, com a quela porrada de exceções e tudo, ter um puta dum vocabulário que incluía, por exemplo “matella, matellae” (2), Significa penico, coisa que saber, pode apostar uma boa aposta, não era pra quem lê pouco, não.

Em francês, indiscutivelmente uma das mais antigas e também mais cultas flores do Lácio, além de muito bela, é “merde” que se diz. Trata-se aí de um monossílabo, e este monossílabo muito curiosamente é bom, muito bom francês. Há peculiaridades deveras interessantes e "aos quilos" a comentar sobre o curioso termo francês, esse “merde”. Os franceses (que conforme bem sabemos são ótimos perfumistas há sei lá quantos séculos, que têm uma longa e mundialmente afamada tradição culinária, que praticamente ditaram a moda pro mundo inteiro por muito tempo e que conseqüentemente são com toda a justiça considerados como um povo do mais refinado e extremado bom gosto, a despeito das nada raras exceções de hoje em dia) não poderiam jamais ignorar solene e historicamente palavra tão expressiva e tão útil da língua que deu origem à sua, e por assim dizer “andar” pra ela, como puderam, quiseram e souberam fazer os imemorialmente fleumáticos ingleses.

Nem poderiam concebivelmente os franceses deixar de transformar a quase vulgar e rude “merda, merdae” dos velhos, cultos e grossos romanos em sua simpática, bem dizer prestigiosa e quase bem-cheirosa “merde”, palavra não só perfeitamente aceitável, presente em todos os bons dicionários, logo achadiça também na “obra” dos mais reputados literatos que a França já deu. Como bem se sabe, estes literatos sempre constituíram a principal fonte da maravilhosa lexicografia tradicional francesa.

Além do óbvio sentido etimo-(escato/copro)-lógico, o termo acumulou, com o tempo, diversos outros. Por exemplo, “traîner quelqu’um dans la merde” significa ridicularizar alguém. E quem melhor do que os franceses pra fazer isso? Um ser desprezível qualquer, animado ou não, é “une merde”, ou “de la merde”.

Como exclamação, “merde!” pode sugerir raiva, impaciência, desprezo, assim como uma pá de outras coisas. Trata-se, aqui, de uso bem mais expressivo, bem mais corriqueiro e bem mais aceitável que o que se deu com nosso correspondente uso de "merda", termo ante o qual (até certo ponto compreensivelmente) são muitos, entre nós, os que torcem o nariz.

Crotte” é um dos nem tão poucos sinônimos populares de “merde” em nosso correlato sentido de merda como sinônimo de bosta, caca, cocô, maomé (3)

Mas então, em francês, a palavra “merde” deu foi crias. Adjetivos como “merdeux” (feminino “merdeuse”), “merdant” (feminino “merdante”), “merdique” (adjetivo comum aos dois gêneros); os substantivos “merdier”, “emmerdement”; o verbo “merdoyer” são apenas uns poucos exemplos do que existe de derivados tirados a fórceps dessa minha memória de "merde", só para ilustrar. Tem é bem mais. Atestam todos eles, em seu conjunto, que a palavra “merde” lá na França goza de incontestável prestígio. Tal afortunada prole de derivados não é pra qualquer uma, não. Lá, como bem sabemos, tradicionalmente (inclusive até hoje, acho) se diz “Merde! Merde!” como uma forma de apreciação coletiva em espetáculos públicos, correspondente ao “Bis!, Bis!” que nós lusófonos dizemos em situação idêntica.

As palavras viajaram, pois, desde o velho e defunto latim até suas filhas relativamente jovens e todas ainda vivas através de caminhos incrivelmente complexos, é bem verdade, mas de modo algum caminhos imprevisíveis, aleatórios, por assim dizer. Tais percursos permitiram o estabelecimento de determinadas analogias, conhecidas entre os estudiosos dessas coisas como “leis fonéticas”.

Tentarei dar um exemplo do que seja isso pra meus leitores que, caso não saibam mas queiram saber (e não me detestem muito porque eu saiba), buscando um paralelo bem fácil entre nosso vernáculo e seu irmão gêmeo univitelino, o espanhol.

Muito que bem. O mesmíssimo termo original latino aqui omitido, (primeiro porque completamente desnecessário para os fins nada acadêmicos do presente post experimental, segundo porque o assunto já pode estar meio saco-enchente e cheirando a uma aula de merda (ou a merda, mesmo?) pra alguns dos meus talvez já bocejentos leitores que até aqui tiveram a generosidade de me acompanhar, e “last but not least at all” porque estou improvisando, e posso de repente não me lembrar mais ou inclusive não saber mesmo o “esperma” do termo exato em latim, o que afinal seria um quinguecongueano mico pra minha erudição, ainda que de merda) percorreu aquelas tais trilhas incrivelmente complexas mas repletas de pontos de répérage seguros, e acabou dando, por exemplo, cá no nosso luso vernáculo em “perto”, e lá no espanhol deles deu em “pierto”. O mesmíssimo latim que deu cá pra nós “sempre”, lá pra eles deu “siempre”. O mesmíssimo latim que deu cá pra nós “tempo”, lá pra eles deu “tiempo”. O mesmíssimo latim que deu cá pra nós “vento”, lá pra eles deu “viento”. O mesmíssimo latim que deu cá pra nós “medo”, lá pra eles deu “miedo”. O mesmíssimo latim que deu cá pra nós “certo, certa”, lá pra eles deu “cierto, cierta”. O mesmíssimo latim que deu cá pra nós “aberto, aberta”, lá pra eles deu “abierto, abierta”.

Conclusão (ufa!) de todos esses meus "mesmíssimos", "cás pra nós" e "lás pra eles" de merda, acima: em nosso português (de nada não, só ameaça), geralmente encontramos um “e” tônico aberto ou fechado em diversas situações nas quais paralela, previsível e sistematicamente acharemos um “ie” também tônico, só que invariavelmente fechado em espanhol, vindos por seus respectivos caminhos históricos do mesmíssimo latim original. Coisa dessas tais leis fonéticas. Portanto, o mesmíssimo latim “merdda, merdae”, que cá pra nós acabou dando em “merda”, lá pra eles já deu foi em “mierda”, o que, segundo rigorosamente as mesmas leis fonéticas, vem a dar rigorosamente na mesma merda (ou mierda, ou merde, afinal, que merda de diferença faz isso?).

O italiano então é quem jamais poderia ficar pra trás nessa história, morando geograficamente na mesma casa em forma de bota onde antes morara o seu defunto ancestral imediato. Já pensou? Nem pensar! Eles, é claro, têm lá sua indefectível “merda”, e também “merdoso”, “merrdosamente”, “merdaio” e por aí vai.

O inglês é língua de origem e evolução histórica não-latina, mas cujo léxico contém bem mais latim do que qualquer outra coisa (lexicógrafos do inglês orçam, salvo meu equívoco ou lapso de memória, entre 57% e 64% o total de raízes latinas em seus respectivos lemários). E o vocabulário escatológico/coprológico ali é, “só pra variar”, um dos mais ricos que há. Existem lá pra eles shit, crap, fiddle, dregs, droppings, dung, manure, e por aí vai, só pra citar os poucos exemplos de pronto acudidos, sem forçar muito a merda da minha memória.

Mas para a boa “merda, merdae” dos velhos romanos, que embora com diferenciados graus de reverência todas as línguas neolatinas acolheram, eles torceram mesmo o nariz, tanto assim que em inglês não há, pelo que me consta, nem a forma “merd*” nem coisa alguma de origem latina que o valha.

___________________________

(1) O caso preferido pelo idioma inglês na hora de tomar substantivos do latim para si foi quase invariavelmente o genitivo. Um caso inclusive bem mais conveniente, por apresentar uma regularidade notavelmente maior, inclusive. Mas o inglês não é filho, e o latim não lhe adentrou, apesar da superdose, através do "código genético". A história ali foi outra. É por esta razão, a da regularidade, que é o genitivo que caracteriza as declinações (genitivo em -ae para primeira, genitivo em -i para a segunda declinação, e por aí vai até o fim, ou a quinta, como prefiram). Corresponde o genitivo àquela segunda forma convencionada já faz é séculos para se apresentar os substantivos latinos. Rosa, rosae (primeira declinação); lupus, lupi (segunda declinação); “diabo-a-quatrus”, “diabo-a-quatru” (quarta de-gozação).

(2)(agora não tenho mais certeza se era com dois eles ou com um só. Deixo por enquanto como está, depois confiro, se
a) me lembrar,
b) houver motivo ou
c) houver solicitação)

(3)(com inicial minúscula, pelo amor de Alá, pois essa gíria "maomé" circulou foi assim mesmo aqui no Brasil. Posso provar que sim, se for obrigado a fazê-lo. Alá [e todos os seus legítimos heterônimos, inclusive Tupã, só por garantia] que me livre(m) e guarde(m) de repetir aqui a quase feliniana saga do poeta Salomon Rushdie, com seus Versos Satânicos e “crappy” que quase ninguém leu, parece-me, mas que todo mundo conhece e ainda lembra e muito bem, basicamente por conta de sua sei lá até que ponto justa mas garantidamente fanática condenação à morte, pelo fato de ambos [tanto o poeta quanto seus famosos versos de merda] terem tão gravemente insultado o Islã).

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Palavrões

No finalzinho da década de setenta e da famigerada ditadura militar brasileira, M. Souto Maior saiu com seu Dicionário do Palavrão e Termos Afins, obra ao que me consta sem quaisquer precedentes no país ou mesmo em língua portuguesa.

Li-a ainda fresca. Dei um rápido balanço em meu próprio vocabulário de doestos, palavras de baixo calão, termos considerados chulos, vulgarismos, plebeísmos e tudo mais nessa linha antes da leitura e descobri (boquiaberto) a até então insuspeitada pobreza do meu próprio vocabulário neste campo.

O prefácio de Gilberto Freyre foi o quanto me bastou para dissipar de uma vez por todas qualquer vestígio de suspeita sobre um possível mau gosto ou baixo nível que o título ainda pudesse suscitar.

Nem sei que fim levou meu exemplar daquela primeira edição, com dois, três mil verbetes, salvo engano, mas lembro que foi uma experiência enriquecedora.

Os verbetes nem sempre estavam tão modelarmente redigidos e as definições algumas vezes assomaram-se-me ou vagas demais ou insatisfatórias pelos mais variados motivos. Atribuo estas características técnicas principalmente à falta de apoio em qualquer tradição estabelecida, ao inevitável improviso, neste caso. Jamais à falta de competência lexicográfica do autor, um trabalhador infatigável com respeitável produção intelectual a seu crédito.

A virtude de oferecer uma profusão de abonos em obras e autores da mais variada reputação foi o ponto alto, para mim. Desconhecia completamente vários deles.

As poucas obras congêneres em língua estrangeira que conheço mais aumentam meu convencimento da oportunidade, mesmo da necessidade de mais esforços lexicográficos neste sentido. Os "excluídos", por assim dizer, de uma língua deveriam receber mais atenção da parte dos estudiosos. Não obstante, é sempre o uqe acontece com excluídos, de qualquer forma. Nunca interessam, mesmo.

domingo, 8 de março de 2009

“-ADA”, UM CASO A CONSIDERAR

Esta simples terminação "-ada" pode encerrar diversas idéias, ou significados. Examinaremos somente alguns destes significados em determinadas palavras que a levam. Assim, bastará observar de que idéias este sufixo derivacional “-ada” é portador. Só com isto já disporemos de uma página quase indefinidamente expansível.


1 ) BANANADA COCADA GOIABADA MARMELADA

Banana”, “coco”, “goiaba” e “marmelo” etc. são substantivos primitivos correspondentes a frutas que com “-ada” formam seus respectivos derivados cujo significado comum é “doce de ---”.

Vários nomes de frutas que também são comumente usadas para se fazer doces não aceitam “-ada” como sufixo derivacional. Por exemplo, “jaca”, “manga”, “jamelão”, etc. Em tais casos, usaremos a locução “doce de ---” anteposta ao nome da fruta.

Já “limão” e “laranja” são nomes de frutas que aceitam nosso sufixo, mas com estes o derivado não traz a mesma idéia de doce, para a qual recorreremos à referida locução. “Limonada” e “laranjada” são refrescos.

2) COTOVELADA CABEÇADA DENTADA JOELHADA PALMADA PERNADA TESTADA UMBIGADA


são os respectivos derivados de “cotovelo, “cabeça”, “dente”, “joelho”, “palma”, “perna”, “testa” e “umbigo”, substantivos primitivos que designam partes do corpo com que se pode golpear. Quando recebem o nosso sufixo com, formam derivados com a idéia de “golpe de ---”.

Já “ombro, “sola do pé”, “costas”, etc. também são nomes de partes do corpo com que se pode golpear, mas normalmente não aceitam a formação de derivados com “-ada” neste sentido.

3) CACETADA CHICOTADA CORONHADA FACADA PAULADA PEDRADA PUNHALADA


são os respectivos derivados de “cacete”, “coronha”, “chicote”, “faca”, “pau”, “pedra” e “punhal”, substantivos primitivos que designam objetos com que se pode golpear e aceitam o nosso sufixo com este significado. Neste sentido um jogador de futebol levou uma “microfonada” no olho, um dia desses.

Mas há nuitos substantivos primitivos que por algum motivo não aceitam a formação de derivados com “-ada” neste sentido.

4) BOIADA CACHORRADA CRIANÇADA, GAROTADA, MULHERADA, RAPAZIADA,

são os respectivos derivados de “boi”, “cachorro”, “criança”, “garoto”, “mulher” e “rapaz”, substantivos primitivos que aceitam “-ada” com idéia de coletivo, grupo.

São muitos os substantivos primitivos que por algum motivo não aceitam a formação de derivados com “-ada” neste sentido.

5) CACHORRADA CAFAJESTADA MOMADA PALHAÇADA

são os respectivos derivados de “cachorro”, “cafajeste”, “momo” e “palhaço”, substantivos primitivos que aceitam o nosso sufixo com o significado de “atitude de ---”, “comportamento de ---”.

São muitos os substantivos primitivos que por algum motivo não aceitam a formação de derivados com “-ada” neste sentido.

Observação: sufixos como “-ice” (de “burrice”, “criancice”, etc.) e “-agem” (de “sacanagem”, “molecagem”, etc.) também podem ser aplicados na formação de derivados com este mesmo sentido, caso em que são equivalentes semânticos de “-ada”.

6) BOBEADA CANTADA CAMINHADA CAPRICHADA COCHILADA DERRAPADA ESPIADA OLHADA PASSADA PENEIRADA TOPADA URINADA VACILADA

Os substantivos acima são derivados dos verbos “bobear”, “cantar”, “caminhar”, “caprichar”, “cochilar”, “derrapar”, “espiar”, “passar”, “peneirar”, “topar”, “urinar” e “vacilar”, respectivamente. Todos podem ser usados como em “dar uma –ada”. A idéia é de ação.

Observação 1: este uso do sufixo “-ada” é típico de um registro bastante informal daí existirem muitos vulgarismos corriqueiros, na maior parte dos casos referentes a funções fisiológicas ou sexuais.

Observação 2: não confundir com os adjetivos verbais que no feminino coincidentemente terminam também em “-ada” (cansada, chateada, inconformada, preocupada, etc.) que se empregam como em “Ela agora está -ada” nem com os particípios que no feminino coincidentemente terminam também em “-ada” (apreciada, estimulada, explorada, incentivada, provada, provocada, roubada, etc.) que se empregam como em “Ela foi –ada


7) CARRADA COLHERADA FORNADA PANELADA PAZADA

são os respectivos derivados de “carro, “colher”, “forno”, “panela” e “”, substantivos primitivos que aceitam o nosso sufixo e assim formam derivados com a idéia geral de “conteúdo de um(a) ---” ou “quantidade que cabe num(a) ---”. São muitos os substantivos primitivos que por algum motivo não aceitam a formação de derivados com “-ada” neste sentido.

Existe a variante “–ado” para casos como “punhado” (de “punho”) “bocado” (“boca”), com significado equivalente.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Googlando para saber frequências de uso

A experiência simples que descreverei é interessante do ponto de vista de se poder confirmar a frequência de determinadas colocações.

Com os substantivos ‘barata’, ‘mosca’, ‘piranha’ e ‘vaca’
e os adjetivos ‘braba’, ‘louca’, ‘morta’ e ‘tonta’,
armei um quadro onde todos os adjetivos determinavam todos os substantivos, dando os seguintes 20 pares de substantivos determinados:

barata braba’, ‘barata louca’, ‘barata morta’ ‘barata tonta’

‘mosca braba’, ‘mosca louca’, ‘mosca morta’ ‘mosca tonta’

‘piranha braba’, ‘piranha louca’, ‘piranha morta’ ‘piranha tonta’

‘vaca braba’, ‘vaca louca’, ‘vaca morta’ ‘vaca tonta’


No caso, todas estas colocações são perfeitamente válidas na língua portuguesa.

Eu naturalmente esperava, por experiência, que todas elas fossem encontradas.

Esperava igualmente que para cada um dos quatro substantivos houvesse um certo adjetivo que o determinasse com uma frequência de longe mais alta.

Googlei então, caso por caso, anotando os respectivos números de casos encontrados no momento. Verifiquei que minhas hipóteses eram todas boas. Os números do Google confirmavam-nas, dando disparado mais ocorrências de ‘barata tonta’, ‘mosca morta’, ‘piranha braba’ e ‘vaca louca’.

Um só par de determinado/determinante não foi encontrada nenhuma vez na hora da pesquisa:‘barata braba’. Por que cargas d'água, afinal, se "mosca braba' eu encontrei? Suponho tratar-se aqui de mera coincidência, pois as colocações ‘perdedoras’ me pareciam todas de igual implausibilidade assim, fora de um contexto, mas todas seriam perfeitamente justificáveis, dependendo do entorno em que porventura se achassem. Lembrar que 'barata', por exemplo, nem sempre se refere a um inseto, ou vaca a um bovídeo, etc.

Fica então a idéia e um modelo facilmente utilizável para incontáveis googladas semelhantes, com excelentes possibilidades se tirar conclusões bastante confiávies da aventura pela língua através dessa incrível ferramenta. Praticamente não há limite. Vários verbos e as preposições com eles mais esperadas [ansiar por, pensar em, sonhar com, etc.], vários verbos e os advérbios com eles mais esperados [apaixonar-se perdidamente, errar redondamente, acreditar piamente, etc.], e todos os etcéteras.

Breve, mais sugestões de utilização do Google como ferramenta para pesquisa em língua(s).